terça-feira, 2 de junho de 2009

A PICADA DULOMBI-GALOMARO OU GALOMARO-DULOMBI

A PICADA DULOMBI-GALOMARO OU GALOMARO-DULOMBI

Quando em Janeiro de 1972, o BCAÇ3872 iniciou a subida do Rio Geba em direcção ao Xime, por onde passavam todos os batalhões e companhias que rumavam à zona Leste da Guiné, muitos de nós ainda não tinham ouvido falar de Bambadinca, Bafatá, Nova Lamego, Pirada, Piche, e muito menos de Galomaro, onde iria situar-se o comando do batalhão e a CCS. A chegada ao Xime, ao fim da tarde, foi o meu grande choque com os “operacionais”, com os que estavam no “mato”, com a realidade da guerra. Havíamos chegado na véspera de Natal de 1971 a Bissau. Na cidade era substancialmente diferente e até parecia que a guerra não existia. Agora ali, onde estavam os homens da escolta do batalhão que íamos render, tudo era diferente. E não era tanto a diferença entre o novo e o velho, mas sim entre o real e o irreal, os que estavam quase livres daquilo e os que, sem muito entusiasmo, passavam aquela porta e iriam passar a “levar” com aquilo.

Tenho pena de não ter na altura uma máquina de filmar, uma máquina de fotografar, que fixasse aquelas imagens que eu via e ainda vejo, das fardas descoloridas, dos quicos desfeitos, dos rostos magros e com a pele tisnada do sol, mas com uma cor doente, amarelada. Que dizer dos rostos risonhos, mas marcados, do material de guerra espalhado nas viaturas. Confesso que fiquei estarrecido a pensar que esta iria ser a hora da mudança. Eles iriam transformar-se, lentamente, no que nós aparentávamos. Nós, dentro de pouco tempo, seríamos como eles eram agora….. Meu Deus, o que faço eu aqui? Foi uma das piores sensações da minha vida. Parecia o inferno de Dante: “Vós que aqui entrais, perdei toda a esperança”.

Chegámos a Galomaro já de noite e só no dia seguinte a CCAÇ 3491 seguiria para o Dulombi, bem como a CCAÇ3490 para o Saltinho. A CCAÇ3489 foi logo directamente para Cancolim.

No dia seguinte, escoltados por elementos da CCAÇ2700, lá fomos estrada fora a caminho do Dulombi, percorrendo pela primeira vez a nossa célebre picada. Passámos pelo cruzamento de Duas Fontes/ Bangacia, onde uns meses antes elementos da CCS, reforçados por atiradores da CCAÇ2700, tinham sofrido uma emboscada a uma coluna, ao cair da noite, que causou 5 mortos. A estrada até Mali Bula, bolanha do Rio Fandaré, ainda se fez razoavelmente, mas a partir daí é que aquilo se tornava uma autêntica picada. Deu logo para perceber que aquele troço não levaria a nenhum paraíso. Depois de passarmos os locais onde tinham rebentado minas A/C, um deles a 300 m do quartel, que causaram baixas mortais entre os camaradas da 27$00, entrámos finalmente em Dulombi.

O "aprazível" local situava-se dentro da linha de fronteira do Leste, redefinidas após a retirada de Beli e de Madina do Boé. De facto a primeira companhia a estabelecer-se no Dulombi foi a CCAÇ2405, em 1970. Esta companhia tinha participado na operação “Mabecos Bravios” – a tristemente célebre retirada de Madina do Boé que causou 46 baixas, por ter adornado a barcaça em que seguia o último grupo de homens, onde estavam muitos elementos da CCAÇ2405, tendo perdido a vida 17 deles. À nossa frente, a cerca de 40 km, tínhamos o Rio Corubalo. Atrás de nós, a 20 km de distância, Galomaro. À nossa direita, a mais de 50 km, o Saltinho. À nossa esquerda, a mais de 60 km, Cancolim e mais a norte Canjadude. Dulombi era, definitivamente, o fim da linha. Tínhamos uma vasta zona de penetração para o IN e de muitos quilómetros de patrulhamento para a companhia.

A picada passou a constituir para nós o único elo com sítios mais importantes e cosmopolitas (a Tabanca do Dulombi teria umas 250/300 pessoas), como Galomaro, Bambadinca, mas especialmente Bafatá. De facto arriscávamos a vida numa coluna que era praticamente semanal, para levar e trazer correio, para obter reabastecimentos, mas também para comermos no libanês de Bafatá, o célebre bife “à bota”. Eram uns momentos de grande impacto social e moralizador para o nosso pessoal, porque naquele restaurante sentávamo-nos todos na mesma mesa, desde o capitão ao soldado, o que era muito apreciado pelo Sr. Anirof, o patrão (que nos dizia ser caso único) e nos trouxe alguns dissabores com o comandante do batalhão estacionado em Bafatá.

As colunas iniciavam-se com uma acção de picagem até um determinado ponto do percurso. Depois, aguardávamos que os camaradas do Pel. Rec. ou Pel. Sap. da CSS, que efectuavam a picagem do troço entre Mali Bula e o tal ponto de encontro, se juntassem nós. Era um grande esforço e recordo-me de falar com os meus camaradas sobre a importância de se fazer um trabalho bem feito na detecção de minas. É verdade que muitas das vezes o resultado eram bolhas nas mãos, mas também foi a detecção das minas A/C que o IN nos colocou e também foi, principalmente, não termos perdido vidas, um ponto alto do nosso esforço que valeu a pena. Com a CSS foi diferente, pois detectaram uma mina A/C, mas de uma outra vez essa sorte não lhes sorriu e tiveram um ferido grave e a perda de uma viatura.

Recordo que houve um período em que se soube que o IN estava a utilizar, isto durante a época da seca, umas minas A/C, em que a parte do top da mina era formada por umas películas finas metalizadas e que a pica de ferro ao trespassar essas películas fazia o contacto (por ser de metal também), accionando a mina. A partir dessa informação o primeiro grupo de picadores só utilizava picas de madeira, que se gastavam, praticamente, numa picagem e necessitavam de maior esforço de penetração na terra.

Dado que os nossos “velhinhos” tinham sofrido as "passas do Algarve" na época das chuvas, em que muitas das vezes ficavam atolados, uma das nossas primeiras medidas foi melhorar a nossa picada, o que foi feito com muito esforço e empenhamento diário de um grupo de combate. Conseguimos construir uma ponte razoável sobre o Rio Fandauol, onde nos abastecíamos, criando um pequeno lago para tomar banho (só na parte da manhã, quando ali estava montada a segurança para a recolha de água), de forma a evitar o atolamento na bolanha, logo a 800 metros da saída do quartel.

Deste modo, quando a época das chuvas surgiu, lá nos fomos safando, continuando as colunas mas, em determinada altura, a bolanha do Rio Fanharé (do lado de Galomaro) fez das suas e ficámos sem abastecimentos durante bastante tempo, até porque também a pista de aviação ficou impraticável. Foram tempos difíceis para todos, em especial para o Capitão Pires, que apanhou com o pessoal a refilar com a comida, porque não tínhamos acesso a frescos.

Quando chovia a nossa velha picada inundava em vários pontos e as viaturas faziam um grande esforço para conseguirem ultrapassar esses locais mais difíceis, com a água a atingir, muitas das vezes, as nossas botas. Parecia que atravessávamos um rio. E falar das picagens nesta altura – um tormento.

Mas se esta picada foi a que nos levou ao nosso “buraco”, também foi ela que nos trouxe aqueles que nos vieram substituir, em Fevereiro de 1974, pelos quais ansiávamos já desde Outubro de 1973. Foi também ela que deixou passar as viaturas civis e militares que, em Março de 1974, saíram do Dulombi, transportando o Capitão, o 2º Gr. Combate e as unidades de apoio da companhia (secretaria, alimentação, transmissões, enfermagem, mecânica e transportes) passaram uma noite em Galomaro e no dia seguinte, com a companhia completa, partiram rumo ao Xime, onde chegáramos mais de dois anos antes.

Para nós da CCAÇ3491, a velha picada do Dulombi-Galomaro, foi o meio de sairmos da “nossa guerra” de regressarmos ao cais, de nos libertar da dor de quase 28 meses de terras quentes e vermelhas da Guiné. Para nós, que com ela parecia termos um pacto, foi uma picada de felicidade.

Às vezes pergunto-me se era capaz, como tantos outros camaradas têm feito, de voltar a fazer o caminho do reencontro com aquela tabanca, com as suas gentes, do retorno `aquela picada….não sei! Lembro-me, isso sim, de que quando saí do Dulombi seguia na viatura da frente e o meu olhar foi sempre dirigido para a picada. Não me recordo de me ter virado uma só vez!

A BOA ESTRELA

Escutei
Por entre o assobiar
Do vento caminhante
O riso alegre
Satisfeito
Daquele camarada
Que parte por ter a tragédia
Terminada
Vai contente
De peito feito
Sobreviveu

Parte também
Outro camarada
Numa caixa macabra
Que numa picada
Jogo de armadilhas
E por emboscada
A sua boa estrela perdeu

Luís Dias

Viatura berliet da CCS, do 1º cabo condutor-auto, Juvenal Amado (tertuliano), mas aqui conduzida pelo Fur. Trms, Idelberto Soares, da CCAÇ3491 e com ele ao lado (!!!). Picada - ou rio - Galomaro-Dulombi. 1973.


Elementos do 4º Gr. Comb./CCAÇ3491, a efectuarem a picagem do trajecto Dulombi-Galomaro, no tempo das chuvas, como é perceptível.

Mina A/C, M-46, ainda enterrada, detectada pela picagem de elementos da CCAÇ3491, em Novembro de 1972, na picada Dulombi-Galomaro.


A cratera da mina A/C colocada na picada Galomaro-Dulombi, em Fevereiro de 1973 e que foi accionada por uma viatura da CCS.

Viatura Unimog 416, após ter accionado uma mina A/C, reforçada por granada de RPG, em 1 de Fevereiro de 1973, na picada Galomaro-Dulombi. As forças da CCS que efectuavam a picagem e escolta eram do Pel. Sap, reforçadas por 01 Gr. Comb. da CCAÇ3490 (Saltinho). Em resultado do rebentamento ficou ferido o soldado condutor que conduzia a viatura e que, por sorte, só não perdeu a vida, porque como seguia sozinho na mesma, não ia devidamente sentado, mas sim instalado sobre o topo do assento e com o acelerador de mão ligado.

O destino final da picada Galomaro-Dulombi - a entrada do aquartelamento do Dulombi. Fevereiro de 1974.
A saída da CCAÇ3491 do Dulombi, depois de ter sido substituida pela 1ª Companhia do BCAÇ4518/73, em Março de 1974.




3 comentários:

caçador disse...

com o maior prazero sr marcelino da mata pode dizer que foi um bom portugues alguns senhores do 25 de abril deveriam estar presos até hoje mal trataram um homem a onde servi o exercito no ral1 na compahia bó na encarnaçao ou lisboa 6 ou moscavide malditos sejam esses senhores como gostaria de ter o telefone desse sr marcelino da mata meu e-mail a g.necho@hotmail.com passem o telefone de um grande portugues portugues nao esta na cor mas sim no coraçao consertesa que eu sei quem o prende preimeiro o pcp e nome nao adianta falar mas muitos ainda estao vivos mas eles devem estar pagando tem um que esta reclamando o salario vai no fidel castro para ele te pagar porque o fidel castro nunca foi ditador ou será que eu estou errado sem povo portugues eu estive no ral 2 que na realidade era conhecido por cica 4 ai sim eu tive vontade de fujir porque o comandente em setembro e ate eu sair de lá que foi no começo de janeiro se 1965 era um ordinario nem comida dava para os soldados esse quartel ficava em coimbra santa clara a gente descia e depois para subir passei fome muita por causa de um senhor banana que já deve estar a esperar por nós fui

Unknown disse...

Camaradas entrei agora no Google e vejo que fui um dos vossos o meu Batalhão 4518/73/74 era condutor ccs unimogue 404 conhecido (S. Mamede) fiz muitas colunas Bambadimca Camcolim Saltinho por fim ainda Nova Lamego estas a entregar turras que se entregavam em Galomaro por agora é tudo um abraço.

Unknown disse...

Boa tarde camaradas peço desculpa se estou a invadir picada privada já escrevi um texto em cima isto por ignorância da nova tecnologia mas a minha anciedade de comenicar com vós é muito forte estive em Galomaro até Setembro 1974 falas em ter embarcado 29 de Dezembro eu também no niassa e regressei em Setembro 1974 no Uigee já agora soube do vosso site por um elemento do vosso grupo Cláudio Sérgio me despeço com abraço António Sousa se puder aderir ao vosso grupo será um orgulho