Ontem, por convite do autor, tive
o grato prazer de assistir no Palácio dos Marqueses do Lavradio, no Campo de
Santa Clara, em Lisboa, ao lançamento do livro, “G3 A GRANDE ARMA NACIONAL”, de
Pedro Manuel Monteiro, editado pela “Conta Corrente”, onde dei um pequeno contributo
sobre as diferenças em combate entre a HK G3A3 e as Kalashnikov, nos modelos
AK-47, AKM e outros modelos das mesmas fabricados por países do Bloco Leste e
pela China, que apoiavam na Guiné o PAIGC, que se enfrentavam no meu tempo de
combatente na Guiné (1971-1974).
Na presidência da mesa
encontrava-se o Vice-Chefe do Estado-Maior do Exército, o Tenente-General,
Paulo Emanuel Maia Pereira. Na assistência diversos oficiais generais, oficiais
superiores, quer ainda no activo, quer na reforma e muitos civis, entre eles,
antigos funcionários do extinto INDEP.
No discurso do Tenente-General,
houve um momento em que foi referida a presença e foi aplaudido de pé, uma
pessoa por quem tenho grande admiração, o Coronel Tirocinado Comando, Raúl
Folques que, no meu tempo de Guiné, foi o Comandante do Batalhão de Comandos,
cargo onde substituiu o então Major Almeida Bruno e que, como se sabe, fez
parte da 1ª companhia de comandos formada em Angola e que é um dos heróis de
Portugal.
Nos anos da Guerra de África a
espingarda automática HK G3 (também designada de espingarda de batalha, devido
ao calibre potente que utilizava - 7,62x51mmNATO - e no formato convencional),
terá passado pelas mãos de perto de um milhão de portugueses e foi a arma que
Portugal escolheu, a partir de 1961, para enfrentar os movimentos
independentistas nas províncias ultramarinas, iniciando-se em Portugal a sua
produção, sob licença da Alemanha (então RFA), em 1962, e a sua atribuição oficial
às forças armadas a partir de 1963.
Foi esta espingarda, encimada no
cano por um cravo, que se revelou um símbolo da Revolução de 25 de Abril de
1974, para toda a gente.
Após o fim da guerra em África,
esta arma continuou a ser importante nas missões atribuídas às nosss forças armadas
pela ONU ou no âmbito da UE, em diversas partes do mundo (Timor, Letónia,
Roménia, República Centro-Africana, Moçambique, Guiné-Bissau, Somália, Mali,
Afeganistão, Alemanha, Polónia e
Kosovo).
As fábricas FMBP e INDEP terão
produzido 442 197 G3, entre 1963 e 1988, segundo Relatórios de Contas
destas fábricas referidos no livro em apreço e
que serviu no nosso país por cerca de 60 anos, estando a ser substituída
no Exército pela FN SCAR, modelo L e H e na Armada pela HK416. A G3, em
conjunto com o mosquete “Brown Bess” de 1808, é arma recebida em maior
quantidade pelo Exército Português, bem como uma das que é usada há mais tempo.
A G3, era e é uma excepcional
arma de guerra, com um projéctil poderoso – o 7,62x51mmNATO, que depois de ter
sido trocado pelo calibre 5,56mmNATO, está novamente a ser recuperado, para
novas gerações de espingardas de batalha e que tinha um som característico e
forte que dava confiança a quem a usava. A G3 necessitava de alguns cuidados na
limpeza (cabeça da culatra), mas em geral trabalhava bem, mesmo nas condições
adversas em que foram utilizadas em África. Tinha o senão de ser uma arma
grande e pesada para o tipo de guerra de guerrilha que enfrentávamos, mas
também tinha um alcance útil superior às armas do inimigo e era também mais
estável e precisa no tiro que as armas adversárias. O seu depósito de munições
tinha uma capacidade inferior ao da kalashnikov mas, por outro lado, tinha um
perfil mais baixo, evitando que o utilizador se elevasse demasiado, quando na
posição de deitado, diminuindo significativamente a silhueta e, ao contrário da
kalashnikov que possuía um carregador curvo e comprido, não tinha necessidade
de se torcer para introduzir um novo carregador na arma. Também o comutador do
tiro era mais simples de utilizar do que da arma preferencial rival e era
silencioso, ao contrário do da AK-47 e AKM que faziam ruídos de clic, na
movimentação para tiro a tiro e para fogo de rajada, o que no mato podia fazer
a diferença.
O mecanismo operativo da
espingarda automática HK-G3, apresentado em 1959 na então RFA é originário e semelhante
ao da StG45 (Mauser) alemã, de 1945 e da CETME espanhola de 1952. O seu
funcionamento é por inércia, actuando os gases sobre a superfície interna do
invólucro e a culatra retarda a sua abertura (“Roller-delayed blowback”) pela
acção conjunta dos roletes de travamento (alojados na cabeça da culatra), da
massa da culatra e da mola recuperadora. O percutor está alojado no interior do
bloco da culatra, dando-se a percussão pela pancada do cão (existente ao nível
do gatilho) sobre a cauda do percutor. A alimentação é garantida pela mola do
depósito (carregador). O extractor de garra, situado na cabeça da culatra,
efectua a extracção da cápsula detonada no movimento de abertura da culatra e a
ejecção dá-se quando a base da mesma encontra (ao nível do punho), um ejector
de alavanca. Após o consumo das munições do depósito, a culatra não fica retida
à retaguarda, como na FN FAL.
No tempo da Guerra de África, era
conhecido o “amor” entre o combatente e a sua G3, apelidando-a, de “namorada”,
a “minha querida”, a “minha amada” ou também por algum nome feminino de alguma
mulher pela qual estivessem encantados. De facto, a maior parte dos militares
dormiam com ela sempre ao lado, fosse no mato ou no quartel. Outros,
fotografavam a arma e colocavam os dizeres “devo-te a vida”.
Luís Dias
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