terça-feira, 24 de abril de 2012

O MEU DIA 25 DE ABRIL DE 1974

O meu dia 25 de Abril de 1974

O meu Batalhão (BCAÇ 3872) chegou da Guiné no dia 4 de Abril de 1974, desembarcados do navio Niassa, no Cais de Alcântara, em Lisboa. Vínhamos de uns longos 27 meses e meio, em cumprimento de uma comissão de serviço, que foi difícil e de grande sacrifício, naquelas quentes terras de África.

No dia 24 de Abril eu tinha combinado com o meu amigo Farinha dos Santos (falecido em 1999 e que fora Alferes comigo na CCAÇ 3491), irmos jantar com duas amigas a um restaurante da Rua Latino Coelho e, depois, mais tarde, arrancarmos para uma noitada numa discoteca situada na Rua Dr. Gama Barros, à Avenida de Roma. Saímos do local por volta das 3h00, e, como não tinha carro, nem o Farinha, despedimo-nos e apanhámos táxis para as respectivas casas. Segui então para a casa dos meus pais (onde ainda vivia), situada em Alfama, em frente à Alfandega. Sei que o táxi passou pelo Terreiro do Paço, mas não reparei em qualquer movimento militar junto à praça e fui dormir descansado.

Seriam cerca das nove da manhã quando tocou o telefone de casa e como os meus pais já tinham saído para o trabalho, levantei-me e fui atender. Era o meu amigo Farinha que em grande alvoroço me dizia que estava a haver um golpe militar e que devia ligar o rádio para saber o que se passava. Fiz o que ele me disse e comecei a ouvir as marchas militares que iam passando, cortadas pelos boletins de aviso à população emitidos pelo denominado Movimento das Forças Armadas, que se iniciava pela frase que se tornaria célebre: “Aqui Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas…..”. Afinal as informações que tínhamos obtido na Guiné estavam a confirmar-se. Sabíamos que algo se iria passar, pois alguns oficiais do quadro diziam que não iriam ficar muito tempo na província, porque a rebelião das Caldas, em 16 de Março, iria continuar e, em breve, iria surgir uma “coisa em grande”.

Não obstante o movimento que se iria tornar conhecido pela sigla MFA, solicitasse à população que mantivesse a calma e ficasse em casa, eu não resisti. Lavei-me, vesti-me e rua com ele.

Percorrer as ruas de Lisboa, observar as gentes, o riso de um povo que sabia que era hora de mudança, que adivinhava que a ditadura dava o seu último grito e que um novo dia podia nascer daquele movimento militar, encheu-me o coração de uma grande alegria. O Rossio, os Restauradores, as ruas principais da baixa apinhavam-se de gente e se havia forças que pensassem opor-se ao movimento, viam que dificilmente conseguiriam contrariar a revolta, pelo apoio popular que cada vez mais se verificava para com os revoltosos.

O Largo do Carmo, onde se situava o Quartel da GNR, onde Marcelo Caetano se acoitara ainda causou alguma expectativa, alguma tensão, quanto ao desenlace, mas a firmeza dos militares, comandados por Salgueiro Maia, fez com que a rendição do Governo se desse.

A forma como o dispositivo estava montado naquele largo, a quantidade de povo envolta, que não queria arredar pé para não perder pitada, fez-me temer o pior, até porque me apercebi que os soldados envolvidos naquela missão não tinham nenhuma experiência militar. De facto, caso a força profissional da GNR, se decidisse por abrir fogo sobre os militares do movimento, dar-se-ia, certamente, um banho de sangue naquele local.

Felizmente tudo correu de feição e viu-se um POVO tomado de alegria a percorrer as ruas, lado a lado com os militares e a gritar pela LIBERDADE tão ansiosamente esperada e que fora cortada durante 48 anos. Voltei para casa, já ao fim da tarde, onde já estavam os meus pais e juntos vimos pela televisão e pela rádio as emissões livres de censura, que nos iam relatando o que se ia passando.

O dia 25 de Abril de 1974 para todos aqueles que o puderam viver não mais será esquecido e será recordado pelo dia em que o povo português recuperou a Liberdade e a alegria de viver e caminhou para a democracia.

Luís Dias

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